Bloco de Esquerda recomenda ao Governo converter e dedicar 25 por cento da área agrícola nacional à agricultura biológica até 2030

O Projeto de Resolução é apresentado na sequência da estratégia da Comissão Europeia, de estender a agricultura biológica a 25 por cento da área agrícola até 2030. Esta meta vai no sentido certo de apoiar a sustentabilidade da agricultura e a conservação da natureza nos médio e longo prazos, enquanto potencia a criação de novos postos de trabalho. 

 

A agricultura biológica é um modo de produção de alimentos e fibras têxteis que recorre a substâncias e processos naturais. A produção agrícola e pecuária em modo biológico deve assentar em boas práticas agrícolas e ambientais, propiciar elevados níveis de biodiversidade, fomentar a preservação da água e dos solos, e aplicar normas exigentes de bem-estar animal. A diversificação de culturas agrícolas, a utilização adequada de rotações e consociações, bem como o recurso à compostagem e à instalação de sebes vivas, aliada à não aplicação de pesticidas e adubos de síntese, permite a produção de alimentos saudáveis sem colocar em risco os recursos naturais e a biodiversidade.

Pela capacidade de melhorar a oferta de produtos agrícolas, a agricultura biológica tem o potencial de aumentar os rendimentos dos produtores e produtoras, contribuindo para a criação de emprego e para a fixação de população em territórios de baixa densidade onde abunda área agrícola. Num país como Portugal onde o fenómeno da litoralização do território se agrava a cada dia que passa, é indispensável que o Estado desenvolva políticas públicas que fomentem as oportunidades de emprego nos territórios do interior do país.

Apesar das vantagens da agricultura biológica para a saúde humana, para o ambiente e para o emprego, este modo de produção agrícola é ainda incipiente em Portugal. Segundo dados da Comissão Europeia para 2018, as terras agrícolas portuguesas dedicadas à agricultura biológica não ultrapassam os 5,9 por cento. A baixa proporção de área agrícola em modo biológico situa Portugal abaixo da média dos países da União Europeia (8 por cento) e coloca-o a uma grande distância do país com maior percentagem de área de agricultura biológica na UE – a Áustria, com 24,1 por cento.

Um olhar atento à aposta austríaca na agricultura biológica permite retirar lições úteis para melhorar a situação agrícola do nosso país, cada vez mais orientada para o agronegócio exportador dos produtos da agropecuária intensiva. As políticas públicas austríacas priorizam, desde a década de 80 do século passado, a qualidade dos alimentos em vez da quantidade. Para acelerar a conversão agrícola do país para o modo biológico, os produtores puderam aceder a apoios públicos suficientes e continuados que permitiram a rápida conversão de milhares de hectares de área agrícola na década de 90. 

Além de frutícolas e hortícolas, a produção biológica austríaca abrange a produção de carne, leite e ovos. O recurso a hormonas de crescimento e antibióticos, como medida preventiva, nas rações animais é proibida. Vigora também a proibição do encarceramento de alguns animais de pecuária. Estudos comparativos, levados a cabo na Áustria, entre áreas agrícolas em modo de produção biológica e áreas agrícolas convencionais demonstram que a agricultura biológica propicia níveis mais elevados de biodiversidade, bem como recursos edáficos e hídricos mais bem preservados.

Recentemente, a Comissão Europeia apresentou a Estratégia do Prado ao Prato e a Estratégia de Biodiversidade que incluem o objetivo de estender a agricultura biológica a 25 por cento da área agrícola até 2030. A meta da Comissão vai no sentido certo de apoiar a sustentabilidade da agricultura e a conservação da natureza nos médio e longo prazos, enquanto potencia a criação de novos postos de trabalho. 

Portugal, dada a sua vulnerabilidade aos efeitos cada vez mais notórios das crises ecológica e climática, onde se incluem períodos de seca cada vez mais intensos e prolongados e a perda acelerada de polinizadores, deve apostar em modos de produção agrícola que não delapidam os recursos naturais nem a biodiversidade, que oferecem condições dignas de trabalho e que se adaptam às condições edafoclimáticas do território. Como tal, o país deve definir para si o objetivo de atingir, em território nacional, 25 por cento de área agrícola em modo de produção biológica. 

A conversão de área agrícola para o modo de produção biológico requer a aplicação de conhecimento técnico e científico que poderá não estar acessível a todos os produtores interessados na conversão. Como tal, o Estado, através dos serviços do Ministério da Agricultura, das instituições de investigação e de ensino superior, e de parcerias com associações de produtores de agricultura biológica devidamente capacitadas, deve disponibilizar todos os meios necessários para que os produtores interessados em produzir em modo biológico tenham à sua disposição o necessário aconselhamento técnico e científico. Dado a escassez crónica de meios humanos, técnicos e financeiros dos serviços do Estado em matéria de Agricultura, o Governo tem o dever de reforçá-los adequando-os às necessidades do país.

Por culturas, em 2018, as pastagens (58%), as forragens (14,2%) e as culturas arvenses (1,3%) representavam 73,5% da área total de agricultura biológica em Portugal. Estas culturas destinam-se a produção animal, mas praticamente não existe carne certificada como “biológica” no mercado. Assim, uma parte considerável dos apoios destinados à agricultura biológica são desviados para sistemas de produção convencionais, que encontraram aqui uma forma de aumentar as suas receitas, captando subsídios sem o compromisso de disponibilizar produtos biológicos aos consumidores.

Desta forma, além de insuficientes, os apoios à agricultura biológica têm sido mal alocados, num país e numa Europa onde a produção é insuficiente para responder à crescente procura de produtos biológicos.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que: