Mariana Mortágua: “Recuperação dos salários é uma condição da recuperação económica"
Mariana Mortágua destacou que a crise de 2008 foi uma crise do regime de acumulação capitalista financeiro, resultante da combinação de dois fenómenos: a financeirização e o crescimento das desigualdades, que são “faces da mesma moeda”. Ao processo de endividamento da alta finança para maximizar os seus lucros, e de toda a população, para fazer face às suas despesas e ter acesso a bens e serviços, somou-se o agudizar da instabilidade financeira e a estagnação económica, resultante da concentração da riqueza em quem não consome, explicou a deputada.
De acordo com Mariana Mortágua, a austeridade surge como uma resposta para permitir recuperar os níveis de acumulação, sendo que um dos primeiros alvos são os direitos laborais.
Não obstante algumas alterações conjunturais, “o sistema está a ser como sempre foi e a acumular desigualdades”, apontou, defendendo que “a economia está presa numa armadilha pela financiarização e desigualdades”.
“Não existem verdadeiras políticas de recuperação económica com austeridade, sem proteção do emprego e dos salários”, frisou, avançando que o sistema financeiro, que “está em festa” e a usufruir da “permanente injeção de capital” por parte dos bancos centrais, “não tem qualquer ligação com a economia real”.
Sobre as conclusões do Conselho Europeu, a dirigente do Bloco referiu que estas se traduzem em mais endividamento, redução dos fundos de coesão e que “as medidas de austeridade continuam lá”. Acresce que Portugal “não tem instrumentos de política industrial ou política económica”. A União Europeia “retirou-nos instrumentos para intervir na economia, para controlar o capital”, operando um verdadeiro desmantelamento dos mecanismos a nível nacional de proteção do trabalho e de tentativa de reequilíbrio entre relação trabalho e capital, adiantou.
O que o neoliberalismo financeiro global faz é a política da corrida para o fundo, expondo os países à enorme chantagem e ao enorme peso da finança
Referindo que “o que o neoliberalismo financeiro global faz é a política da corrida para o fundo”, expondo os países “à enorme chantagem e ao enorme peso da finança”, Mariana Mortágua defendeu que a recuperação económica depende do controlo público de empresas estratégicas, da escolha de áreas de desenvolvimento e da proteção das relações laborais.
“A recuperação de salários é uma condição da recuperação da economia”, vincou a deputada, acrescentando que “a economia tem de servir interesses públicos e estratégicos definidos democraticamente”.
“É neste contexto de neoliberalismo agressivo e autoritário que surgem os populismos de direita e extrema direita”
Francisco Louçã lembrou que o Bloco “tem procurado sempre historicamente uma posição que reforça o lugar do trabalho” e que combate o regime de acumulação, que “institui uma desigualdade fundamental entre capital e trabalho”.
“Todas as estratégias de acumulação se concentram na desigualdade institucional, legal, contratual, na violência que a exploração e a pobreza representam e na vontade de retirar os instrumentos de expressão ao movimento operário, ao movimento popular e ao movimento dos jovens”, afirmou o economista.
Neste contexto, “queremos ter um sujeito político, uma força política que reorganiza a capacidade popular e que se baseia na luta dos jovens para poder trazer uma radicalidade da expressão de uma posição socialista”, no “combate à desigualdade, pela democracia económica e social”, avançou.
A austeridade é, de acordo com Francisco Louçã, “a jaula que organiza a destruição da capacidade de resposta do trabalho e que impõe à sociedade em geral o pagamento de uma renda, que é a vantagem social do capital”.
É neste contexto de neoliberalismo agressivo, autoritário, que surgem os populismos de direita ou extrema direita, com Trump, Bolsonaro, Salvini ou com a emergência de partidos como o Vox em Espanha ou o Chega em Portugal
Como a globalização neoliberal que teve início nos anos 80, com o programa de privatizações, imposição da precarização, destruição do Estado Social, contenção dos salários, não produziu uma acumulação muito intensa, “passou a uma fase mais agressiva”, com o “neoliberalismo conjugado com o autoritarismo”, explicou o ex coordenador do Bloco.
“E é neste contexto de neoliberalismo agressivo, autoritário,” que têm vindo a surgir “os populismos de direita e extrema direita, com Trump, Bolsonaro, Salvini ou com a emergência de partidos como o Vox em Espanha ou o Chega em Portugal”, apontou.
“Este é o contexto que nós estamos a viver”, continuou, enfatizando que, por essa razão, “o combate à austeridade procura constituir uma força social que defende os salários e os direitos para combater o predomínio do capital”. “Isto traduz-se em muitas políticas que o Bloco tem defendido”, apontou, afirmando que é trazendo para a vida das pessoas respostas concreta às suas necessidades que se faz a política e o combate à austeridade.
“É uma hipocrisia falar de países frugais"
Mariana Esteves falou sobre as consequências da crise no emprego para as gerações mais novas, com as estimativas da OCDE a apontarem para uma taxa de desemprego de 17% caso se registe uma segunda vaga de covid-19.
A jovem economista recordou que as principais vítimas da crise pandémica são os trabalhadores precários, muitos deles já atingidos pela crise da troika. Por outro lado, para quem sai agora da universidade, as perspetivas de futuro dependem de uma mudança nas políticas adotadas até aqui, e de quebrar com o círculo vicioso das medidas de austeridade, pelo que “o grande desafio desta nova geração” é exigir uma mudança de rumo.
Mariana Esteves fez ainda referência às consequências da perda de receita fiscal para países como Portugal, considerando ser uma hipocrisia falar de países frugais, quando sabemos que a Holanda tira receitas de impostos aos outros países.