Campo de tiro aos pratos do Clube Desportivo Campos do Lis desrespeita o ambiente e coloca em causa a segurança pública
O Bloco recebeu filmagens que comprovam os problemas descritos e que estão disponíveis em dois vídeos (aqui e aqui).
Vídeo com declarações do deputado Heitor de Sousa, depois da visita ao campo de tiro (aqui).
No passado mês de maio, foi este Grupo Parlamentar informado pela Associação dos Moradores e Amigos da Gândara dos Olivais, sita na Freguesia de Marrazes, concelho de Leiria (AMAGO) para um conjunto de denúncias escritas enviadas por aquela Associação a diversas entidades com intervenção direta ou indireta na atividade de um campo de tiro aos pratos que existe naquela Freguesia, propriedade do Clube Desportivo Campos do Lis Outeiros-Gândara, Leiria.
Apenas para informação, listam-se as entidades que foram expressamente contactadas para tomarem conhecimento do conteúdo das queixas: PSP/DAE (Departamento de Armas e Explosivos) e da PSP/DIF (Divisão de Investigação e Fiscalização); APA; CCDRCentro; Câmara Municipal de Leiria/Vereação do Ambiente e da Saúde; Junta da União de Freguesias dos Marrazes e da Barosa; Oikos de Leiria.
De todas, a Associação conseguiu perceber que as queixas chegaram ao seu destino, mas as respostas foram sempre ineficazes. O Campo de Tiro continua a sua plena atividade, particularmente reforçada aos fins-de-semana, como se nunca tivesse acontecido qualquer impedimento que tivesse estado na origem de uma qualquer perturbação do seu perfil normal de atividade.
As denúncias têm evidentemente maior incidência sobre questões respeitantes à qualidade de vida das populações e do ambiente existente nas cercanias do Campo de Tiro. Há queixas sobre “a poluição sonora que a população está sujeita todos os dias, havendo dias com quatro campos de tiro a funcionar em simultâneo”, “toneladas de chumbo que são despejados por ano na ribeira dos Marrazes que atravessa o Campo“, “ruído ensurdecedor sobre um recinto desportivo que existe no limite de um dos campos de tiro e onde muitas crianças e adolescentes praticam desportos coletivos, sendo por vezes brindadas com resíduos de chumbo que lá vão parar por inépcia dos praticantes”, “algumas residências que exibem marcas de tiros de chumbo nas paredes exteriores nas casas que estão situadas nas proximidades do campo de tiro que lhe está mais próximo”, “dos resíduos dos pratos que se acumulam especialmente nas margens da ribeira ou que estão dissimulados pelo matagal, que entretanto cresceu à frente dos campos de tiro, e que esconde toneladas de detritos por limpar”, “das preocupações que as populações revelam por estar a ser construído um centro escolar mesmo em frente ao campo de tiro, aparentemente com autorização camarária”, de incongruências como “a lei da caça proíbe tiros a menos de 250 metros de casas e o campo de tiro está a cerca de 100 metros”, de perplexidades, de que é exemplo “como é possível que não exista quaisquer tipo de proteções que obriguem à vedação efetiva dos campos de tiro, quer em termos sonoros, quer em termos de proteção dos espaços circundantes, sejam naturais, sejam das pessoas que circulam na mata, nas proximidades do Campo” ou “como é possível que não tenham sido realizadas medições de ruído à atividade de tiro quando este está em plena atividade” ou ainda “como é possível que não ocorram fiscalizações regulares quer por parte da Agência Portuguesa do Ambiente, quer por parte da Câmara Municipal, às condições de funcionamento e de recolha e encaminhamento dos resíduos às entidades certificadas para tal”?
Tudo isto foi quase integralmente testemunhado por uma visita que o Bloco de Esquerda de Leiria, junto o Grupo Parlamentar, realizou ao local durante o mês de junho (incluindo ao Clube Desportivo), onde se pôde efetivamente confirmar que as queixas da população e da AMAGO eram plenamente justificadas. É mau demais para nada acontecer após mais de um ano, entre o momento em que as primeiras denuncias foram apresentadas (junho de 2018) até à atualidade. Não há notícia de nenhuma medida corretiva por parte de qualquer das entidades contactadas tenha sido imposta ao Clube de Tiro para cumprimento e as únicas respostas limitam-se a “tomámos conhecimento e vamos averiguar”. Até hoje, zero.
O decreto regulamentar nº 6/2010 de 28 de dezembro, define as regras aplicáveis ao licenciamento de complexos, carreiras e campos de tiro para a prática de tiro com armas de fogo. Consultado este decreto regulamentar, verifica-se que, no artigo 2º, com a epigrafe “Âmbito”, apenas é exigido o parecer favorável de duas entidades para o licenciamento desta atividade: à PSP, a quem compete “a verificação das condições técnicas e de segurança das instalações e das áreas envolventes, nos complexos, carreiras e campos de tiro” e às federações desportivas de tiro titulares do estatuto de utilidade pública desportiva, que “a) emitem parecer, com carater vinculativo, sobras asa condições técnicas e de segurança dos campos onde se realizem provas desportivas”.
Sendo motivo de perplexidade que se observe uma situação de clara desconformidade legal no processo de licenciamento deste tipo de recintos desportivos, que não estão, por exemplo, obrigados ao licenciamento prévio de natureza ambiental (APA) ou de ordenamento territorial (IGAMAOT), que imponha regras estritas para proteção da natureza e das pessoas, não deixa igualmente de ser ainda mais surpreendente que, neste contexto de queixa dos habitantes e dos amigos da Gândara dos Olivais/Marrazes, tenha surgido a notícia de que a Direção Nacional da PSP renovou, com efeitos a partir do final de fevereiro, o alvará de funcionamento do campo de tiro por mais 5 anos, cujo termo estava previsto para 05/02/2019.
Acresce que, aparentemente, nenhuma entidade fora da PSP ou das federações desportivas tem poderes fiscalizadores sobre uma atividade que tem evidentes repercussões sobre o ambiente em que se inscreve, especialmente quando o mesmo é urbano. E numa altura em que se fala tanto de descentralização de competências para as autarquias, não deixa de ser curioso notar que, segundo o decreto regulamentar nº 6/2010, de 28 de dezembro, as autarquias também não têm quaisquer competências legais para o licenciamento desta atividade.
Atendendo ao exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda vem por este meio dirigir ao Governo, através do Ministério da Administração Interna, as seguintes perguntas:
- Tem o Ministério da Administração Interna conhecimento da situação que ocorre com o funcionamento do Campo de Tiro do Clube Desportivo Campos do Lis Outeiros – Gândara dos Olivais - Leiria?
- Considera o Governo aceitável que, nas condições descritas pela AMAGO, seja renovado por mais 5 anos (até 2024) um alvará de funcionamento deste campo de tiro quando existe um processo de contestação da população, apoiado pela própria Junta de Freguesia, que exige a suspensão imediata desta atividade até que seja possível averiguar, em concreto, as denúncias e queixas apresentadas pelas populações?
- Considera o Governo aceitável que a fiscalização do funcionamento deste tipo de atividades possa ser feita sem qualquer intervenção regular por parte de entidades públicas nacionais ou locais com obrigação inspetiva em áreas como o Ambiente e o Ordenamento do Território, como sejam o IGAMAOT, o SEPNA ou os serviços ambientais e de proteção da natureza das autarquias?
- Está o Governo disposto a introduzir alterações à legislação em vigor a fim de submeter o licenciamento e a emissão de alvará de complexos, carreiras e campos de tiro à verificação prévia de normas de proteção ambiental, ordenamento do território, defesa dos recursos hídricos, uso de solos, prevenção e controlo da poluição sonora por parte das entidades públicas cuja competência incide sobre cada uma destas áreas?
A pregunta apresentada ao Governo pode ser seguida no site da Assembleia da República, aqui.