Saúde e Educação - Duas faces de um mesmo problema [Newsletter: Lado Esquerdo]

Se perguntarmos a qualquer cidadão quais foram as principais conquistas do 25 de Abril, além das mais óbvias e naturais, Liberdade e Democracia, seguramente que Educação e Saúde estarão entre as respostas mais comuns. Respostas mais frequentes ainda se entre pessoas oriundas de famílias pobres e de meios desfavorecidos e com poucos recursos.

Além do esforço sobre-humano de muitas famílias na garantia dos bens essenciais e de um meio familiar harmonioso, foi a existência de um Sistema de Educação público e de um Serviço Nacional de Saúde (SNS) solidários e gratuitos que permitiram a tantas crianças e jovens que vivem por este pobre e assimétrico país, que Portugal ainda não deixou de ser, escapar a um ciclo vicioso de pobreza e ter as ferramentas mínimas necessárias para sobreviver num mundo capitalista, injusto e desigual. Foram, são e continuarão a ser os factores decisivos.

Muito se fez com tão pouco, e o que se assiste hoje em dia, é ao depauperar do “pouco” que existia. Como muitos outros serviços públicos, a Educação e a Saúde vivem tempos conturbados. De outros serviços poderia falar, como a Segurança Social e a Justiça, mas, por trabalhar na área da Saúde e por ter estudado em todos os graus do ensino público, são estes os serviços públicos cuja realidade melhor conheço. Apesar de fragilidades específicas e muito próprias, são vítimas de um mesmo problema: desinvestimento. Desinvestimento nos seus profissionais e nos seus já limitados recursos.

Os professores são os agentes moldadores dos futuros cidadãos de plenos direitos de uma sociedade, ao passo que os profissionais de saúde são os cuidadores dos seus mais frágeis e doentes. Para concretizarem de forma capaz o seu desígnio, tanto professores como profissionais de saúde, precisam dos meios e dos recursos adequados. Muito mudou durante os quase 50 anos de democracia, desde a mudança do perfil sociodemográfico até à omnipresente revolução tecnológica.

Se professores trabalham com turmas sobrelotadas, profissionais de saúde deparam-se com listas de utentes sobredimensionadas. Esta realidade, aliada à falta de recursos e ao sufocamento imposto por burocracias sem um propósito concreto, desvirtua-se o sistema por completo. Em vez de professores dedicarem tempo a ensinar e a preparar aulas, e profissionais de saúde a cuidar dos seus utentes, ficam reféns de papéis e relatórios para se preencher, elaborar, apresentar e, no final, acabarem numa qualquer gaveta, com utilidade nula e para nunca mais serem lidos. Mas foram feitos. Consumiram tempo, e roubaram tempo ao essencial: aos alunos e à escola, aos utentes e ao SNS!

Afinal, que país queremos e merecemos?

A resposta deveria ser fácil e imediata: um país com uma escola próxima e inclusiva, atenta aos seus alunos, e um SNS proactivo no cuidar dos seus utentes e respectivos problemas. Para isso, é preciso investir. Investir na escola pública. Investir no SNS. Investir no que nos é garantido e devido na Constituição. Assim, é necessário reconhecer a mais-valia que são os seus profissionais, a alma dos serviços, rever carreiras profissionais, atualizar grelhas salariais, garantir os recursos práticos necessários, aliviar a burocracia, digitalizar e uniformizar plataformas.

Na Educação e na Saúde vivem-se carências. São duas faces de um mesmo problema. A solução, não sendo simples, é conhecida. Sim, é preciso dinheiro e investimento. E ele existe, não haja qualquer dúvida! O que é preciso e urgente é vontade e coragem de o ir buscar para onde ele está a ser indevidamente desviado, com consentimento, nem que seja por inércia, por parte de quem decide e governa o país.

 

Texto: Rafael Henriques