Bloco questiona Governo: Já existem planos de reflorestação e gestão para as Matas Litorais ardidas?

O Bloco questionou o Governo sobre os Planos de Reflorestação e de Gestão Florestal para as diversas matas ardidas, que até hoje ainda são desconhecidos. Questiona também sobre a aceitação do ICNF das várias propostas realizadas pela Comissão Científica para a Recuperação das Matas Litorais, e se as mesmas serão integradas nos planos em falta. Esta foi a primeira pergunta ao Governo subscrita pelo deputado eleito pelo distrito de Leiria, Ricardo Vicente.

A Mata Nacional de Leiria / “Pinhal do Rei” é a maior mata nacional, de propriedade e gestão públicas, com uma área de 11.021 hectares e uma história que remonta a mais de 700 anos. Foi vítima de um incêndio, em Outubro de 2017, que se estima ter destruído 86% da área. Na sua continuidade foram também atingidas as matas nacionais de Pedrógão (90%), do Urso (54%), das Dunas de Quiaios (63%) e os Perímetros Florestais de Dunas de Cantanhede (81%) e Dunas e Pinhais de Mira (53%). No total, estima-se ter ardido 67% da área de floresta pública localizada nesta faixa litoral, o que corresponde a 24.344 hectares.

Em resposta a um Requerimento (n.º 89/XIII (4.ª)) apresentado pelo Bloco de Esquerda em Abril de 2019, o Governo anterior tornou públicos um conjunto de documentos sobre a recuperação das Matas Litorais, onde destacamos a síntese do programa de investimentos até 2022, o Relatório da Comissão Científica de Recuperação das Matas Litorais e o Parecer do Observatório do Pinhal do Rei.

Passados dois anos, existem vários sinais preocupantes:

  1. Ainda há madeira ardida por cortar nas Matas e Perímetros Florestais afetados em áreas consideráveis;
  2. São conhecidos diversos relatos sobre o crescimento e propagação de plantas invasoras nas áreas ardidas e não ardidas e de expansão de problemas fitossanitários que estão a afetar as áreas não ardidas;
  3. São desconhecidos Planos de Reflorestação das Matas e Perímetros Florestais que espelhem os serviços que estas devem prestar, com a definição das espécies a integrar, da sua dispersão, extensão e localização geográfica. Em simultâneo, surgem notícias de investimentos realizados em reflorestação, com incorporação de diversas espécies florestais;
  4. São desconhecidos os novos Planos de Gestão Florestal (PGF) das Matas Nacionais e Perímetros Florestais. A título de exemplo, no caso da Mata Nacional de Leiria, o último PGF data de 2010;
  5. O Relatório da Comissão Científica de Recuperação das Matas Litorais faz um diagnóstico da situação atual da Mata e apresenta propostas concretas para o seu futuro, algumas delas contraditórias, como assinala o Parecer do Observatório do Pinhal do Rei. Não está claro se o ICNF aceita as propostas constantes do Relatório da Comissão Científica, como são exemplo as seguintes:
    1. O capítulo 3 sobre “Monitorização de Erosão Eólica e Hídrica” propõe a monitorização e avaliação da erosão hídrica e eólica do solo em áreas dunares costeiras, mas até hoje desconhece-se a implementação destas medidas nas ML.
    2. O capítulo 4, sobre monitorização e controlo de invasões biológicas, apresenta uma proposta de definição de prioridades de intervenção e elenca diversas medidas de controlo, mas é até hoje desconhecido se o ICNF aceita esta priorização assim como não se sabe quais as medidas a tomar e a sua calendarização. Também o capítulo 9, “normas e modelos de silvicultura”, aborda a necessidade de controlar as espécies invasoras em particular o eucalipto, sendo de grande  preocupação a invasão que estas espécies exóticas já atingiram em muitos locais das matas nacionais.
    3. O capítulo 6, “recuperação de habitats terrestres” propõe: a intercalação de “talhões ou áreas escassamente arborizadas e possuidoras de charcos permanentes (mesmo que artificiais)”; e “talhões ou faixas, quando edafoclimaticamente faça sentido, de 50-100m de largura com sobreiro e/ou outras folhosas entre os talhões de pinheiro bravo”. Ainda neste capítulo, propõe-se a implementação de uma rede de monitorização de habitats terrestres das ML, a partir de um plano de ação específico; sugere-se o estabelecimento de modelos de gestão silvícola que venham a otimizar os serviços de ecossistema múltiplos, desde a produção, à conservação da biodiversidade, ao incremento do valor cultural, do turismo e do recreio, através da instalação de povoamentos mistos contendo espécies florestais diversas, com vista à heterogeneidade de paisagem propiciadora da recuperação e restauro de diversos tipos de habitat que não apenas pinhal. Até hoje não se sabe se estas propostas foram aceites, nem a sua dimensão e localização.
    4. O capítulo 11, sobre participação pública e sensibilização, alerta para a importância da capacitação e envolvimento da população e dos agentes locais, que habitualmente são desprezados pelo ICNF. Segundo os autores, entre os 10 PGF atualmente em vigor, 7 não obtiveram qualquer contributo em consulta pública e 3 tiveram apenas 1 contributo. Neste capítulo propõe-se que o PGF comece por descrever o processo de participação pública, mas não havendo ainda novo PGF, não se conhece nenhum processo participativo em curso o que indicia um grande atraso na produção do PGF ou, mais uma vez, a negligência sobre a participação pública. Os autores propõem que a condução do processo participativo seja realizada por “uma equipa de facilitação independente (sem ligação ao ICNF)”. Até hoje não se sabe se o ICNF aceitou estas propostas.

 

Atendendo ao exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda vem por este meio dirigir ao Governo, através do Ministro do Ambiente e da Ação Climática, as seguintes perguntas:

  1. Qual a dimensão da área ardida que ainda tem madeira por cortar em cada Mata Nacional (MN) ou Perímetro Florestal (PF) afetados pelos incêndios de 2017? Que proporção desta área possui madeira com interesse comercial?
  2. No caso da Mata Nacional de Leiria, o incêndio afetou a Região do Samouco, que foi no passado classificada - como Biótopo Corine - devido à sua grande relevância ecológica e presença de espécies e habitas com estatutos de proteção, nomeadamente para a conservação da natureza na União Europeia. Qual a proporção da área ardida deste biótopo? De que forma se prevê a sua recuperação e conservação?
  3. Já existem Planos de Reflorestação para cada uma das MN e PF ardidos em 2017? Se sim, onde estão disponíveis para consulta?
  4. Já existem propostas de Planos de Gestão Florestal (PGF) para cada uma das MN e PF ardidos em 2017? Se sim, para quando se prevê o período de consulta pública?
  5. Considera o Governo necessário incorporar as recomendações da Comissão Científica de Recuperação das Matas Litorais nos Planos de Reflorestação e Planos de Gestão Florestal das MN e PF ardidos em 2017? Caso os mesmos ainda não estejam concretizados, para quando prevê o Governo a sua concretização?
  6. No caso das áreas de proteção das várias Matas Litorais, estão a decorrer ou previstas ações concretas de monitorização das dinâmicas costeiras e da evolução das sucessões ecológicas? Se sim, quais? Ainda para estas áreas, está previsto algum plano de recuperação e restauro? Se sim, onde está disponível para consulta?
  7. Já existem planos de controlo de espécies invasoras e do eucalipto, em execução, para as MN? Se sim, onde estão disponíveis para consulta? E quais são as áreas e espécies prioritárias para intervenção?
  8. Existem planos de investimento detalhados para cada uma das MN, com a descrição dos montantes, da tipologia das ações e previsão temporal de execução, para além do documento “Programa de investimentos ICNF 2018-2022 (Síntese)” disponível no site do ICNF? Está o Governo disponível para os tornar públicos?

 

31 de Outubro de 2019