“O estado de emergência não deve suspender a democracia e os direitos”
No debate parlamentar sobre a declaração do estado de emergência na sequência do surto de covid-19, a coordenadora do Bloco sublinhou “a impreparação de todo o mundo perante um vírus que não conhece fronteiras e contra o qual não temos ainda armas eficazes”. “Estamos a viver uma crise inédita e que causa natural alarme”, reiterou.
Catarina Martins fez também questão de manifestar preocupação perante o aumento do número de infetados, deixando “votos de rápida recuperação de todos os que estão doentes”, e pesar face à notícia de que há duas vítimas mortais em Portugal, sublinhando a solidariedade “com a dor das suas famílias e amigos”.
A dirigente bloquista pensa que “em todo o país” está a ser dada uma “resposta inédita” a esta situação. Por isso, agradeceu aos profissionais de saúde, pelo seu trabalho, à generalidade da população, por seguir “de forma exemplar as orientações da Direção Geral de Saúde”, às forças de seguranças e aos trabalhadores dos setores público e privado, “que garantem o funcionamento de serviços essenciais” e às pessoas em vigilância e isolamento profilático, nomeadamente ao povo de Ovar que está sob quarentena geral.
Para Catarina Martins estas atitudes são motivo de orgulho de um país que manteve “o essencial”: “a serenidade pública e uma profunda mudança de comportamentos, tal como recomendado pelas autoridades de saúde”.
Mas o orgulho pela forma como o país tem respondido à crise, não esconde “que pode haver quem não esteja à altura do momento e até quem se tente aproveitar da crise”. Referia-se à “vaga de despedimentos de trabalhadores precários”, ao “abuso laboral de algumas empresas que arriscam irresponsavelmente a saúde dos trabalhadores, recusam planos de contingência e até a proteção dos grupos de risco”, à “vampirização do Serviço Nacional de Saúde pelo negócio privado da saúde
- que se fecha na resposta à crise na esperança de vir a ter as contratualizações dos casos mais simples a que SNS não pode responder agora”, às empresas que “produzem material essencial ao país neste momento - desde logo máscaras e equipamentos de proteção individual - e optam pela exportação”.
O Bloco julga que estes “têm de ser chamados à responsabilidade” e que “o governo tem de agir” porque “não podemos tolerar quem se aproveita da crise”. E, no seu entender, é “para isso - e só para isso - que deve servir o Estado de Emergência”.
O partido adverte no entanto que, no prazo de duas semanas, “cá estaremos para avaliar os termos da sua aplicação”. E avisa que o estado de emergência - excepcional e transitório - “não deve servir para suspender a democracia nem direitos essenciais”.
Intervenção de Catarina Martins na íntegra
Senhor Presidente
Senhor Primeiro-Ministro
Senhoras e senhores membro do governo
Senhoras e senhores deputados
Estamos a viver uma crise inédita e que causa natural alarme.
Vemos a impreparação de todo o mundo perante um vírus que não conhece fronteiras e contra o qual não temos ainda armas eficazes.
Recebemos com pesar a notícia de duas vítimas mortais em Portugal, estamos solidários com a dor das suas famílias e amigos.
Acompanhamos com preocupação o aumento do número de infetados e fazemos votos de rápida recuperação de todos os que estão doentes.
Uma crise inédita que, sim, exige uma resposta inédita.
E vemos como em todo o país essa resposta está a ser dada.
Os profissionais de saúde, todos eles, estão a dar essa resposta inédita. Obrigada.
A generalidade da população, que está a seguir de forma exemplar as orientações da Direção Geral de Saúde. Obrigada.
As forças de seguranças, os trabalhadores dos setores público e privado, que garantem o funcionamento de serviços essenciais. Obrigada.
As pessoas em vigilância e isolamento profilático, o povo de Ovar que está sob quarentena geral, todos estão a dar essa resposta inédita. Obrigada
Devemos orgulhar-nos do que estamos a demonstrar enquanto país.
Mantivemos o essencial - a serenidade pública e uma profunda mudança de comportamentos, tal como recomendado pelas autoridades de saúde.
Não desconhecemos, no entanto, que pode haver quem não esteja à altura do momento e até quem se tente aproveitar da crise.
A vaga de despedimentos de trabalhadores precários a que estamos a assistir.
O abuso laboral de algumas empresas que arriscam irresponsavelmente a saúde dos trabalhadores, recusam planos de contingência e até a proteção dos grupo de risco;
A vampirização do Serviço Nacional de Saúde pelo negócio privado da saúde - que se fecha na resposta à crise na esperança de vir a ter as contratualizações dos casos mais simples a que SNS não pode responder agora - tal seria fazer negócio com a crise
As empresas que produzem material essencial ao país neste momento - desde logo máscaras e equipamentos de proteção individual - e optam pela exportação.
Têm de ser chamados à responsabilidade. E o governo tem de agir. Não podemos tolerar quem se aproveita da crise.
Para agir, precisa de instrumentos. Para isso - e só para isso - deve servir o Estado de Emergência.
Pela parte do Bloco de Esquerda, admitimos este instrumento, considerado necessário pelo Presidente da República e a que o governo é favorável, conscientes das dificuldades que enfrentamos. E cá estaremos, no prazo de duas semanas, para avaliar os termos da sua aplicação.
O estado de emergência - excepcional e transitório - não deve servir para suspender a democracia nem direitos essenciais. Em duas semanas, o Governo deve criar e impor os mecanismos de contingência que protegem a saúde dos trabalhadores, de requisição do setor privado da saúde, de reforço da produção industrial essencial. Essa é uma das prioridades: garantir a resposta do SNS e apoiar os seus profissionais. Simultaneamente, pensar nas pessoas e nos seus rendimentos.
O que propõe o Bloco? O reconhecimento da emergência sanitária e da emergência económica e social. Primeiras medidas: proibir despedimentos, despejos e cortes de luz, gás, água e comunicações. Suspender prestações de crédito à habitação e rendas de casa às pessoas que tenham os seus rendimentos gravemente diminuídos.
Não estamos a inventar a roda: estas são medidas em preparação, ou até já adotadas, em diversos países da União Europeia.
É preciso ajudar a economia e criar pacotes de apoio e financiamento que mantenham a produção e o emprego - e sublinho a modéstia do pacote anunciado pelo governo português, em percentagem do produto, quando comparado com o de outros países, a começar pela Espanha..
A pandemia traz com ela uma crise económica. Não podemos repetir os erros cometidos na resposta à crise anterior. Proteger o emprego é proteger o país e é por isso que urge parar os despedimentos. Isso é condição para podermos enfrentar a dinâmica recessiva que se instalará.
O país está a mostrar o seu melhor na solidariedade cidadã e no civismo demonstrado. Temos longas semanas ou meses - em condições adversas - para continuar a dar uma resposta que todos trate com dignidade. Quem precisa de cuidados, quem está a trabalhar em risco por aquilo de que todos precisamos, quem está isolado e vulnerável, quem vive a ameaça do desemprego.
Será com responsabilidade, democracia e solidariedade que ultrapassaremos esta crise.