Bloco acusa Governo de compadrio com a indústria da celulose

Foram ignoradas as recomendações da Comissão Científica para a recuperação do Pinhal de Leiria e das matas litorais ardidas em 2017, que ainda hoje não têm planos de gestão florestal atualizados, colocando o Estado a dar um mau exemplo como proprietário e gestor florestal.

O que falta ao Governo em disponibilidade para acolher o interesse público, abunda em compadrio com a indústria da celulose  

Intervenção do deputado Bloquista, Ricardo Vicente, hoje, 6 de maio,

no Parlamento, a respeito de um pedido de autorização legislativa para concretizar o Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais (proposta de Lei aqui).

Obrigado sr. presidente, Srs deputados, Srªs deputadas,

Senhor Secretário de Estado,

Bem sabemos que em termos de política agroflorestal, de prevenção e combate a incêndios este Governo ignora frequentemente muitas das recomendações técnico-científicas disponíveis até ao momento. Criam-se Comissões Técnicas, Observatórios e Grupos de Peritos, mas depois ignoram redondamente as suas recomendações. Esta forma de Governar é irresponsável e contrária ao interesse público e os seus riscos são eminentemente crescentes com o avançar das alterações climáticas.

Não faltam exemplos de recomendações essenciais que foram ignoradas.

Fizeram-no ao determinar que a Agência de Gestão Integrada de Fogos Rurais seria integrada no ICNF em vez de funcionar como interagência, como aconselhado pela Comissão Técnica Independente na proposta que a originou. Ainda agora começou e já sobra confusão entre profissionais com competências semelhantes, mas com vínculos e remunerações muito diferentes, alocados à AGIF e ao ICNF. Para não falar da promoção salarial dos dirigentes do ICNF face a outras direções gerais. Onde é precisa estabilidade e cooperação o Governo decide pela turbulência.

Ignoraram as recomendações científicas aquando da Produção do Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais, com o lançamento da estratégia de forma desligada do Programa de Ação. Programa que ainda hoje o Parlamento não conhece a sua versão final e por isso o que o Governo nos solicita agora é um cheque em branco para a sua execução. Votaremos contra. Não falta descaramento ao Governo, pois sabem que o Parlamento decidiu retomar o funcionamento do Observatório Técnico Independente por 60 dias, para que este garanta a emissão de Parecer sobre o programa de ação em causa. O Governo convive mal com a transparência, o escrutínio e o debate público nesta matéria.

Ignoraram as recomendações científicas referentes à formação profissional e à estabilidade no emprego, de que é bom exemplo o caso dos sapadores florestais, que não têm carreira profissional e estão espartilhados por várias entidades diferentes em diversos contextos de precariedade.

Ignoram as recomendações científicas quando decidem manter Planos Regionais de Ordenamento Florestal com metas desadequadas, assumindo como prioritários os povoamentos puros de eucalipto, contrariando o Programa de Transformação da Paisagem e as necessidades de adaptação do território às alterações climáticas.

Ignoraram as recomendações da Comissão Científica para a recuperação do Pinhal de Leiria e das matas litorais ardidas em 2017, que ainda hoje não têm planos de gestão florestal atualizados, colocando o Estado a dar um mau exemplo como proprietário e gestor florestal.

Está atualmente a ser preparada a aplicação de uma nova Política Agrícola Comum. As decisões de aplicação nacional vão ser preponderantes para conseguir mudar a estrutura florestal do país e garantir resiliência aos incêndios rurais. O Governo criou um grupo de Peritos para apoiar este processo, mas já houve várias manifestações de descontentamento e uma demissão acusando o Governo de falta de transparência, de ignorar o interesse público e as recomendações dos Peritos.

O que falta ao Governo em disponibilidade para acolher o interesse público, abunda em compadrio com a indústria da celulose a quem não foi capaz de aplicar uma taxa. Só assim se justifica também, que a avaliação ex-ante e a Avaliação Ambiental Estratégica da Política Agrícola Comum estejam entregues à AgroGes, vejam bem, empresa do Ex-Secretário de Estado das Florestas, Francisco Gomes da Silva, que foi recentemente promovido a Diretor Geral da CELPA, associação da indústria das celuloses.

Questionada ontem em Comissão se este conflito de interesses é para manter, a ministra da agricultura nada respondeu (vídeo aqui).  

Ver vídeo da intervenção aqui.