Bloco recomenda ao Governo o apoio aos Sistemas de Produção Agrícola, Florestal e Pecuária Extensivos
Os sistemas de produção agrícola, florestal e pecuária extensivos possuem elevados valores ambientais, paisagísticos, culturais, sociais e económicos. O olival tradicional, a título de exemplo, é um sistema multifuncional capaz de gerar benefícios que vão muito além da produção de azeite de qualidade. Os olivais extensivos, em terraços, caracterizam e enriquecem a paisagem de alguns territórios, contribuindo há séculos para a definição da identidade e cultura das populações. O mesmo se pode dizer a respeito dos sistemas de produção vitivinícola com vinha em terraços tradicionais, com muros de pedra, que constituem o Alto Douro Vinhateiro, ou sobre as vinhas da ilha do Pico, nos Açores, ambos classificados pela UNESCO como Património da Humanidade.
Também o montado de sobro, o sistema agro-silvo-pastoril do Barroso e tantas outras áreas do território que combinam a silvicultura com práticas agrícolas e pecuárias extensivas, demonstram que da atividade agrícola, em especial das explorações de minifúndio, muitas vezes de cariz familiar, resulta muito mais do que a produção de alimentos. Trata-se da construção e manutenção de paisagens, da preservação de biodiversidade, mas também da fixação da população em territórios rurais e da resiliência do território aos incêndios e às alterações climáticas.
Assim, é essencial valorizar a atividade agrícola, florestal e pecuária de uma forma mais ampla, permitindo a manutenção de sistemas de produção essenciais para a prestação de um conjunto de serviços de ecossistema que hoje são reconhecidos a muitas explorações, em especial as que recorrem a variedades e castas locais, plantas e raças autóctones, garantindo assim, também, a preservação das bases genéticas que durante milénios suportaram a alimentação das populações. A preservação desta diversidade in situ é essencial para a adaptação e mitigação às alterações climáticas.
Apesar da diversidade e importância destes benefícios, os mesmos não são remunerados aos produtores. Exemplo: os cruzeiros que percorrem o Rio Douro, promovem uma atividade lucrativa que depende da manutenção do património histórico e paisagístico vitivinícola da região, mas os muitos pequenos viticultores que garantem a sua manutenção não recebem qualquer remuneração que resulte dessa atividade e as vinhas tradicionais que mais valorizam a paisagem são hoje as que mais dificuldade têm em valorizar a sua produção. Se queremos manter o património paisagístico, sociocultural e vitivinícola da Região Demarcada do Douro, é fundamental que quem trabalha estas terras e mantém a paisagem seja devidamente remunerado pelo seu trabalho, que vai para além da produção de uvas.
No olival, no amendoal, na vinha e em muitas outras culturas e atividades agroflorestais, está em marcha um processo desregulado de intensificação da produção, que além de grandes impactos ambientais, está a gerar enormes assimetrias socioeconómicas que acabam por desincentivar os produtores e destruir sistemas de produção tradicionais e biodiversidade local de valor incalculável. Esta transformação está ainda a ser feita à custa da aplicação de mão-de-obra desqualificada e de trabalho precário, com grande recurso a trabalhadores migrantes, que são mais vulneráveis.
Para responder a este problema, o Bloco de Esquerda já apresentou várias propostas para travar os sistemas de produção intensivos e promover a transição ecológica agroflorestal, assim como para garantir justas formulações de preços aos produtores. Em alguns casos, além da justiça na formulação de preços e na atribuição de apoios públicos, é necessário promover a remuneração de outros serviços que podem ser identificados, monitorizados, valorados e devidamente remunerados por dinheiros públicos e/ou privados. Para tal, é necessário que existam estudos de suporte à política pública nesse sentido.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
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Tome medidas de apoio à justa formulação de preços, promoção, valorização e distinção no mercado da produção agrícola, florestal e animal, de variedades locais, espécies e raças autóctones;
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Realize estudos de identificação e valoração de serviços de ecossistema, prestados por sistemas de produção agrícola, florestal e pecuária extensivos, que recorram a variedades locais, espécies e raças autóctones;
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Garanta, através do próximo quadro comunitário de apoio, a monitorização e a remuneração dos serviços de ecossistema identificados nos estudos supracitados, que respondam ao interesse público no âmbito da prevenção de incêndios, da preservação e recuperação da biodiversidade, e da adaptação do território às alterações climáticas;
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Assegure que a aplicação de dinheiros públicos nacionais e comunitários para a remuneração de serviços de ecossistema em território nacional tenha um carácter progressivo em função do cumprimento de metas concretas e quantificáveis de serviços prestados e de criação de emprego.
Assembleia da República, 8 de outubro de 2020.